Santo
Tomás de Aquino está para a teologia, assim como Johann Sebastian Bach
está para a música, e se como disse Ludwig Van Beethoven que um
herege converte-se ouvindo Bach, o que dizer de um herege ao ler Santo Tomás de
Aquino? Em todos os
tempos, dificilmente o mundo conheceu uma mente como a de santo Tomás de
Aquino. Sob a imagem de um homem gordo,
alto, pacatíssimo e silencioso, residia uma alma magnífica; uma mente que viria
a assustar o mundo do pensamento – e da igreja – com a sua aplicação da
filosofia de Aristóteles à teologia, o que G.K Chesterton chama de “o batismo
de Aristóteles”. Santo Tomás foi sempre proposto pela Igreja como mestre
de pensamento e modelo do modo reto de fazer teologia . Depois de Santo Agostinho,
este também um gigante do pensamento teológico, Santo Tomás é o Santo mais
citado no catecismo da Igreja católica; é citado por sessenta e uma vezes.
Santo
Tomás surgiu no mundo em 1225, no seio da família dos Condes de Aquino, família
feudal de origem germânica e normanda, no reino de Nápoles. Ainda jovem, foi
encaminhado na vida monástica, sendo enviado ao mosteiro de Monte cassino, onde
receberia as primeiras instruções sobre teologia. Porém, foi em Nápoles, onde
havia uma universidade fundada por Frederico II, Imperador excomungado, que aos
14 anos Santo Tomás teve seu primeiro contato com a filosofia aristotélica,
filosofia esta que tornar-se-ia para o santo a filosofia por excelência.
O
Doutor Angélico, como ficou posteriormente Santo Tomás, em determinado momento,
sente-se de alguma forma atraído pela ordem dos Dominicanos, ordem fundada por
São Domingos de Gusmão, e decide separar-se da família, pois esta o impedia de
aderir ao hábito dominicano. O que o atraía nos Dominicanos era a efervescência
intelectual e apostólica. Conta-se que ao dirigir-se para Paris, foi
sequestrado pelos irmãos e trancafiado numa torre de castelo dos Aquino, onde
seus irmãos, com o intuito de ferir-lhe o celibato, fizeram entrar na masmorra
uma mulher, meretriz da época, para seduzir o Santo. Santo Tomás tomou em suas
mãos um pedaço de lenha que fumegava na lareira e como quem tenta espantar
lobos, expulsou a meretriz do aposento, e ao fechar a porta, traçou com a lenha
fumegante o sinal da cruz na porta fechada.
Em
1245, dirige-se à paris, onde coloca-se sob a tutela intelectual de Santo
Alberto Magno. À época, reinava o Jovem São Luis e estava em término a
construção da catedral de Notre Dame, a qual que se tornaria a “Nova Atenas”;
território dominado pelo intelecto agudíssimo dos estudantes de Paris.
G.K
Chesterton escreveu uma excelsa obra biográfica de Santo Tomás de Aquino,
considerado pelos grandes biógrafos de Santo Tomás, como a maior e mais
eloquente obra sobre o Doctor Angelicus. Nesta obra, Chesterton relata a grande amizade que brotou em ambos os
corações – de Santo Tomás de Santo Alberto Magno – pois Alberto Magno havia
percebido a aguda inteligência de Santo Tomás e ousou até, quando todos o
alcunhavam de “Boi mudo”, por ser Tomás extremamente silencioso, a dizer que
“este boi há de mugir tão alto que assustará o mundo!” Foi o próprio Alberto
magno, o conferencista e mestre erudito que começou a suspeitar do vigor pela
verdade em Santo Tomás. Ele encarregava Tomás de pequenas tarefas, de anotação
ou exposição depois de convencê-lo a deixar de lado o embaraço e participar de
ao menos um debate. Santo Alberto havido sido convidado pelos Superiores
da Ordem para fundar uma Casa de estudos teológicos, e aceitando de pronto,
expôs sua única e impávida condição; levar consigo o “Boi Mudo”. Então, Tomás
entrou em contato com todas as obras de Aristóteles e dos seus comentadores
árabes, que Alberto ilustrava e explicava.
Santo
Tomás pôs-se a estudar profundamente as obras de Aristóteles, e as traduções de
seus comentadores, distinguindo nelas aquilo que era válido daquilo que era
duvidoso, ou que devia ser totalmente rejeitado, demonstrando a consonância com
os dados da Revelação cristã e utilizando ampla e perspicazmente o pensamento
aristotélico na exposição dos escritos teológicos que ele mesmo compôs. Em
última análise, Tomás de Aquino mostrou que entre fé cristã e razão subsiste
uma harmonia natural. E foi esta a grande obra de Tomás, que naquele momento de
desencontro entre duas culturas – naquele momento em que parecia que a fé devia
render-se perante a razão – demonstrou que elas caminham a par e passo, que
quanto parecia ser razão não compatível com a fé não era razão; e aquilo que
parecia ser fé não era tal, enquanto se opunha à verdadeira racionalidade;
deste modo, ele criou uma nova síntese, que veio a formar a cultura dos séculos
seguintes.
Santo
Tomás iniciou sua produção literária, quando em virtude de suas explícitas
capacidades intelectuais, foi convidado a retornar á Paris, para lecionar
Teologia na Cátedra Dominicana, onde floresceram de sua mente comentários à
Sagrada Escritura, comentários aos escritos de Aristóteles, obras sistemáticas
imponentes, entre as quais sobressai a Summa Theologiae, tratados e
discursos sobre vários argumentos.
Entre
1261 e 1265, quando esteve em Orvieto, por ordem do papa Urbano IV (que nutria
grande estima pelo Santo), Santo Tomás compôs hinos para festa de Corpus
Christi, em honra à Sagrada Eucaristia, hinos estes que são verdadeiras obras
primas cujas belezas em forma de melodias musicais e letras de refinado teor
impulsionam a alma em direção ao Céu ; exemplo destes hinos é o hino Panis Angelicus, que tornou-se apresentação
obrigatória em grandes eventos de música erudita. (veja o Vídeo).
Outra
obra prima voltada para a adoração Eucarística é o hino Adoro te Devote,
composto também a pedido do papa Urbano IV, após a promulgação da bula “Transiturus”,
que institui a festa de Corpus Christi. (Veja o vídeo)
Os
pensamentos de Santo Tomás foram tão marcantes para a Igreja, que fala-se que
no Concílio Tridentino, nas sessões conciliares, ao lado da Sagrada Escritura
encontrava-se aberta e amplamente consultada a Suma Teológica, obra que o
consagrou como “O Teólogo por excelência”.
Após
algumas décadas em desuso, o Papa leão XIII, através da encíclica Aeterni
patris suscitou a necessidade de voltar-se à Santo Tomás, para opor-se aos
erros de uma época dominada por erros doutrinais e filosóficos, o que ficou
conhecido com Tomismo Leonino.
Embora
fosse possuidor de uma capacidade intelectual singular e fosse absurdamente
culto, Santo Tomás tinha em iguais de grandezas uma humildade e simplicidade
evangélicas. O papa Bento XVI relembra essa qualidade em seu discurso na
Assembléia geral em 02/06/2010: “os
últimos meses da vida terrena de Tomás permanecem circundados por uma atmosfera
particular, diria misteriosa. Em Dezembro de 1273 ele chamou o seu amigo e
secretário Reginaldo para lhe comunicar a decisão de interromper todos os
trabalhos porque, durante a celebração da Missa, tinha compreendido, a seguir a
uma revelação sobrenatural, que tudo aquilo que tinha escrito até então era
apenas "um monte de palha". É um episódio misterioso, que nos ajuda a
compreender não só a humildade pessoal de Tomás, mas também o facto de que tudo
o que conseguimos pensar e dizer sobre a fé, por mais elevado e puro que seja,
é infinitamente ultrapassado pela grandeza e pela beleza de Deus, que nos será
revelada plenamente no Paraíso.”
Santo
Tomás de Aquino Morreu enquanto se encaminhava para o Concílio ecumênico de
Lião em 7 de março, em Fossanova, concílio esse convocado pelo Papa Gregório X.
Deixou a terra ainda em ebulição reflexiva e contemplativa, e foi canonizado
pelo Papa João XXII, e hoje é um dos Santos mais venerados da Igreja e
inspiração salutar para todos os teólogos e amantes dos livros.
Santo Tomás de Aquino, rogai por nós!
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